sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Da. Jezabel, uma vizinha furiosa


Da. Jezabel, uma vizinha furiosa

                                                                       Por  Jurandir Dias



Necessito contratar um empregado para serviços domésticos, mas tenho encontrado dificuldades apesar de muita gente se apressar a se candidatar para tal vaga por causa da crise de empregos. O meu antigo empregado me roubou e está preso. Este ex-empregado indicou um amigo dele para substituí-lo. Agora, estou  em dúvida se devo ou não contratar o amigo do ladrão.

Diante dessa circunstância, estando com a minha esposa na casa de Da. Jezabel, nossa vizinha, resolvemos consultá-la. Esta senhora tem fama de ser uma pessoa culta e está sempre envolvida com movimentos políticos. Além disso, é católica e admira muito o Papa Francisco. Achei que, de repente, ela pudesse resolver o meu problema.

Sentindo-se toda orgulhosa por depositarmos nela certa confiança ao apresentar-lhe uma dificuldade, ela tomou um ar professoral, e me deu o seguinte conselho:

  - Olha, Sr. Jurandir, muitas vezes é melhor ter alguém que você já conhece a índole ao seu lado, e saber o que esperar dela do que um mero figurante desconhecido e cheios de falhas imensuráveis onde você nem pode imaginar as loucuras possíveis e fora do contexto de realidade frágil que o Brasil apresenta atualmente. Sou a favor de ter como funcionário aquele que já sei o que esperar, fica muito mais fácil de se controlar... É melhor conhecer o terreno onde se pisa do que se aventurar no desconhecido sem bússola, sem GPS...

Surpreso com aquela sugestão, respondi-lhe:

 - Se entendi bem, Da. Jezabel,  a senhora prefere, por exemplo, pegar um taxi dirigido por um estuprador conhecido - pois já conhece a índole dele - do que pegar um outro dirigido por um mero figurante desconhecido... O que não entendo é como a senhora sabe que o desconhecido é "cheio de falhas imensuráveis". Onde está a lógica de seu argumento?

A discussão ficou acalorada e a minha interlocutora resolveu apelar para ofensas pessoais:

- O senhor entendeu muito bem a contextualização, mas, por ceticismo e idolatria partidária, prefere fugir do contexto. Parabéns ao senhor que com toda a sua vivência ainda continua preso ao despotismo elitista que existe no Brasil. Fico pensando se o faz pela sua origem nordestina e europeia (sic), ou por achar que o simples operário não tem direito a uma educação de qualidade. Estou há algum tempo divagando sobre seus artigos naquele site reacionário. E cada dia mais me convenço de que à direita radical convém as virtudes que o senhor agrega para si.

- Sim da. Jezabel, sou a favor das verdadeiras  elites tradicionais, mas não dos ditadores atuais em seus palacetes, com carros luxuosos importados e que atravessam continentes para ir almoçar num dos restaurantes mais caros do mundo, enquanto o seu povo morre de fome.

Da. Jezabel é defensora do “diálogo” e da “tolerância”. Entretanto, parece que ela não queria dialogar comigo porque não tolera as minhas ideias. Por isso, preferiu mudar de assunto. Aliás, já tínhamos perdido o foco da discussão.

Nesse momento, ela se lembrou de nos oferecer um cafezinho. A minha esposa e eu respondemos em uníssono:

 - Muito obrigado, Da. Jezabel! Já estamos indo embora.

Da. Jezabel fez-me lembrar de Churchill, quando uma deputada inglesa que detestava as suas ideias, disse-lhe: "Senhor Churchill, se eu fosse sua esposa, colocaria veneno no seu chá.” E Churchill respondeu: "Se fosse seu marido, eu o beberia."

O risco, contudo, não era de ter veneno no cafezinho da nossa vizinha furiosa. O perigo hoje é de levar uma facada do adversário quando ele não tem argumentos...



Um comentário:

  1. Sr. Jurandir, sensacional explanação... mas há de convir que alguns, com pouco entendimento para eleger o tal doido, que gosta do tal que atravessa um continente para almoçar em um restaurante caríssimo, enquanto seu povo passa fome, podem ter dificuldades em entender o contexto.

    ResponderExcluir

Faça um blogueiro feliz, comente. A sua opinião é muito importante.