Da. Jezabel, uma vizinha furiosa
Por Jurandir Dias
Necessito contratar
um empregado para serviços domésticos, mas tenho encontrado dificuldades apesar
de muita gente se apressar a se candidatar para tal vaga por causa da crise de
empregos. O meu antigo empregado me roubou e está preso. Este ex-empregado
indicou um amigo dele para substituí-lo. Agora, estou em dúvida se devo ou não contratar o amigo do
ladrão.
Diante
dessa circunstância, estando com a minha esposa na casa de Da. Jezabel, nossa
vizinha, resolvemos consultá-la. Esta senhora tem fama de ser uma pessoa culta
e está sempre envolvida com movimentos políticos. Além disso, é católica e
admira muito o Papa Francisco. Achei que, de repente, ela pudesse resolver o
meu problema.
Sentindo-se
toda orgulhosa por depositarmos nela certa confiança ao apresentar-lhe uma
dificuldade, ela tomou um ar professoral, e me deu o seguinte conselho:
- Olha, Sr. Jurandir, muitas vezes é melhor ter
alguém que você já conhece a índole ao seu lado, e saber o que esperar dela do
que um mero figurante desconhecido e cheios de falhas imensuráveis onde você
nem pode imaginar as loucuras possíveis e fora do contexto de realidade frágil
que o Brasil apresenta atualmente. Sou a favor de ter como funcionário aquele
que já sei o que esperar, fica muito mais fácil de se controlar... É melhor
conhecer o terreno onde se pisa do que se aventurar no desconhecido sem
bússola, sem GPS...
Surpreso
com aquela sugestão, respondi-lhe:
- Se entendi bem, Da. Jezabel, a senhora prefere, por exemplo, pegar um taxi
dirigido por um estuprador conhecido - pois já conhece a índole dele - do que
pegar um outro dirigido por um mero figurante desconhecido... O que não entendo
é como a senhora sabe que o desconhecido é "cheio de falhas
imensuráveis". Onde está a lógica de seu argumento?
A discussão
ficou acalorada e a minha interlocutora resolveu apelar para ofensas pessoais:
- O senhor
entendeu muito bem a contextualização, mas, por ceticismo e idolatria
partidária, prefere fugir do contexto. Parabéns ao senhor que com toda a sua
vivência ainda continua preso ao despotismo elitista que existe no Brasil. Fico
pensando se o faz pela sua origem nordestina e europeia (sic), ou por achar que
o simples operário não tem direito a uma educação de qualidade. Estou há algum
tempo divagando sobre seus artigos naquele site reacionário. E cada dia mais me
convenço de que à direita radical convém as virtudes que o senhor agrega para
si.
- Sim da.
Jezabel, sou a favor das verdadeiras
elites tradicionais, mas não dos ditadores atuais em seus palacetes, com
carros luxuosos importados e que atravessam continentes para ir almoçar num dos
restaurantes mais caros do mundo, enquanto o seu povo morre de fome.
Da. Jezabel
é defensora do “diálogo” e da “tolerância”. Entretanto, parece que ela não
queria dialogar comigo porque não tolera as minhas ideias. Por isso, preferiu
mudar de assunto. Aliás, já tínhamos perdido o foco da discussão.
Nesse
momento, ela se lembrou de nos oferecer um cafezinho. A minha esposa e eu
respondemos em uníssono:
- Muito obrigado, Da. Jezabel! Já estamos indo
embora.
Da. Jezabel
fez-me lembrar de Churchill, quando uma deputada inglesa que detestava as suas
ideias, disse-lhe: "Senhor
Churchill, se eu fosse sua esposa, colocaria veneno no seu chá.” E
Churchill respondeu: "Se fosse seu
marido, eu o beberia."
O risco,
contudo, não era de ter veneno no cafezinho da nossa vizinha furiosa. O perigo
hoje é de levar uma facada do adversário quando ele não tem argumentos...
Sr. Jurandir, sensacional explanação... mas há de convir que alguns, com pouco entendimento para eleger o tal doido, que gosta do tal que atravessa um continente para almoçar em um restaurante caríssimo, enquanto seu povo passa fome, podem ter dificuldades em entender o contexto.
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