domingo, 31 de julho de 2016

Filhos das trevas e filhos da luz

Filhos das trevas e filhos da luz


Já há algum tempo, alguns analistas têm comparado os conflitos ao redor do mundo como equivalentes a uma Terceira Guerra Mundial, que ocorreria aos poucos por meios de crimes, massacre e destruição. Mas essa guerra não é uma guerra qualquer. Trata-se de uma guerra de religião. A guerra contra a civilização cristã e o que dela ainda resta. Tal guerra, promovida pelo Estado Islâmico, vem produzindo vítimas quase todos os dias na Europa, especialmente na França e na Alemanha. Tivemos nessa semana, dia 26, o assassinato brutal de um sacerdote na França.
Há 69 anos, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira já alertava sobre o perigo da expansão do “Sacro” Império de Maomé, o contrário do que foi o Sacro Império Romano Alemão. Por isso, o artigo que reproduzimos abaixo continua atual. Em 1947, ele escreveu nas páginas do Legionário: “as potências maometanas passam por um renascimento nacionalista e religioso verdadeiramente assombroso.” Mas a causa disso é o sono do mundo ocidental que não quer ver, e continua a negar que os atentados recentes tenham ligação com o Estado Islâmico.
O Prof. Plínio conclui o seu apelo dizendo: “Mas os católicos continuam a dormir. No Horto das Oliveiras, eles dormiram também…”
Passamos a transcrever o mencionado artigo:
Há poucas semanas, os maometanos alcançaram um triunfo indiscutível na Índia, com o reconhecimento oficial do Estado do Paquistão. As comunidades islamitas daquela região, que viviam sob direção inglesa, coarctadas a todo momento em sua liberdade de movimentos pelo incomodo convívio com os braamistas, se viram finalmente independentes daqueles, e dissociados destes. Uma nova unidade política maometana surgiu no concerto das nações, representando um povo rejuvenescido, pujante, rico e colocado em situação geográfica e política de indiscutível importância.Enquanto este fato se dá no extremo oriente da Ásia, o mundo maometano se mobiliza inteiro na orla do Mediterrâneo para nova empresa, em favor da qual vibram todos os adeptos do Profeta, desde o Ganges até o Marrocos. É a “guerra santa” – sim, uma verdadeira guerra santa – pela posse dos Lugares Sagrados.
Já temos tratado por vezes do problema da Terra Santa. Voltaremos a ele hoje, porque, se bem que o Ocidente e especialmente o mundo católico pareça dormir, há dois motivos de ordem religiosa, ambos transcendentais, que nos forçam a não perder de vista esta questão. Em primeiro lugar não nos podemos esquecer de que a Terra Santa, na qual se passou toda a História Sagrada, na qual sobretudo nasceu, viveu, ensinou, padeceu e morreu  Nosso Senhor Jesus Cristo, é para nós, depois da Eucaristia e da Sé Romana, o que há de mais sagrado no mundo. Tanto isto é verdade, que nossos maiores empenharam os esforços mais extremos e ousados para que a Terra Santa não ficasse em poder dos infiéis. Somos do sangue dos cruzados, e não nos podemos esquecer de que o ideal da libertação do Santo Sepulcro empolgou e levou até o sacrifício do sangue e da vida várias gerações de mártires cristãos. Em segundo lugar, a propósito da posse da Terra Santa, os maometanos estão revelando uma solidariedade, uma energia, um brio que mostra claramente que tudo caminha para a formação de um formidável super-Estado maometano afro-asiático. No próprio momento em que URSS, com suas nações satélites ou escravas, ameaça o Ocidente, o aparecimento de mais este inimigo só pode ser indiferente aos políticos imediatistas, e de vistas curtas. Por tudo isto, a questão maometana, que, se não é ainda inteiramente uma questão de hoje, já é indiscutivelmente uma grave questão de amanhã, nos interessa e nos preocupa. Vejamos, pois, de que forma ela está evoluindo.
Não o faremos, porém, sem afirmar previamente que, na luta entre judeus e maometanos, absolutamente não temos preferências nem simpatias. Somos do tipo de católicos que se recusam obstinadamente a escolher entre [uns e outros]; e que, postos nesta alternativa, só têm uma resposta que dar: viva Cristo-Rei! * * *
A Terra Santa é Terra Santa para a Santa Igreja, e para todas as seitas e igrejolas na Europa, da Ásia Ocidental e da África Setentrional, a títulos aliás bem diversos. Lá se passaram os fatos relevantes do Antigo Testamento, de onde o interesse dos judeus. Lá se passaram também os fatos do Novo Testamento: motivo a mais para o interesse dos católicos, dos protestantes, dos cismáticos. Lá se passaram, ainda, muitos dos fatos da história religiosa dos maometanos: de onde o interesse do seguidores do  “Profeta”. Estes motivos religiosos, que dão tanta importância à Terra Santa, são conhecidos, antigos, e fundamentais. Ele interessa os cristãos, judeus e muçulmanos do mundo inteiro, ou seja a maior parte dos habitantes do globo. Ao lado deles, há uma questão étnica e política muito menor, mas irritante. Os judeus se julgam no direito de voltar à Palestina. Sobretudo agora, devido à possibilidade de novo conflito mundial, eles se precipitam para lá, um pouco de todos os pontos do universo. Ora, o super povoamento judaico da Palestina colocará em inferioridade numérica e política (sem falar da inferioridade econômica, já se vê), os muçulmanos, religiosa e racialmente inimigos dos judeus. De onde uma reação árabe contra  este fato. No meio disto, tratados como bagaço, estão os cristãos da Palestina e Síria. Os católicos do resto do mundo pouco se interessam por eles. Eles mesmos parecem ter uma visão muito confusa dos riscos que correm, quer com o predomínio dos árabes, quer com o dos judeus. Sãoquantité  négligeable neste jogo confuso e temível.
Diga-se, para completar este quadro, que a imigração judaica na Palestina deu maior atualidade ao problema, mas que ele já é velho. De há muito, os judeus estão afluindo para a Terra Santa, onde já construíram uma cidade monumental e moderníssima, Tel-Aviv. O protesto árabe contra este fato também é velho.  O que no problema não é velho é que, até há algum tempo atrás, os árabes da África ou mesmo da Ásia meridional se mostravam totalmente desinteressados do problema. Vivendo sob a ação de um torpor secular, não se preocupavam com o aspecto religioso do caso. Politicamente falando, seus problemas eram inteiramente independentes dos da Palestina. Assim, assistiam indiferentes ao desenrolar dos fatos, limitando-se quando muito a alguma atitude puramente platônica, de solidariedade para com os árabes da Palestina. Politicamente, o problema palestiniano continua igualmente desinteressante para as potências maometanas. Mas todas elas passam  por um renascimento nacionalista e religioso verdadeiramente assombroso. O sopro desse renascimento percorre toda a imensa faixa que vai do litoral atlântico do Marrocos até o Paquistão. E, em virtude do renascimento religioso do que poderíamos chamar a “islamidade”, o problema palestino passou a interessar todo o mundo maometano. Por isto, o “caso” judaico-árabe da Terra Santa se  transformou no ponto álgido da política norte-africana e asiática. Tivemos uma amostra disto na violência das manifestações anti-brasileiras ocorridas no Egito pelo simples motivo de que  nosso representante na ONU votou contra os elementos árabes da Palestina.  A luta está concorrendo por sua vez para estimular ainda mais o renascimento pan-árabe e pan-maometano. E, assim, os acontecimentos vão dando aos muçulmanos do mundo inteiro uma consciência cada vez mais nítida, mais vigorosa, de sua unidade, de seu poder, de seus interesses religiosos e políticos comuns.
De há muito, tudo caminha neste sentido. Alguns fatos do noticiário político desta semana, que motivaram mais proximamente este artigo,  mostram que o movimento para a formação de um mundo pan-islâmico se está acelerando cada vez mais.
Com efeito, de há muito os estados Árabes constituíram uma Liga que é uma pequena ONU maometana. Ou antes – quanta é nossa dor ao dize-lo – um Sacro Império, não Romano Alemão, mas maometano anticristão. Já não se pode falar mais de uma Cristandade em nossos dias, e aí está diante de nós, pujante e agressiva, a Islamidade. A isto chegamos. Choramos aos pés da Cristandade quase arrasada, como os judeus junto ao muro das lamentações…
Esta Islamidade, funcionando como outrora funcionava a Cristandade, reuniu-se em Beirute, em sessão plenária da Liga Árabe, e decretou uma espécie de cruzada: pela unanimidade dos presentes, foi resolvido que todos os Estados maometanos mobilizassem seus recursos militares em defesa dos árabes da Terra Santa. As tropas do Egito e da Síria já estão aptas a marchar a qualquer momento.
O eco desta mobilização geral já chegou até Tanger, no outro extremo da África. O delegado do Partido Nacionalista Reformista da zona espanhola do Marrocos já declarou que todos os partidos muçulmanos da África do Norte atenderão à ordem de mobilização da Liga Árabe, por meio de um ou alguns corpos expedicionários, que participarão de todas as operações de “libertação”.
Não se tenha a ilusão de que os motivos religiosos são secundários em tudo isto. Um telegrama de Damasco já vem declarando que naquela cidade “se anuncia que a Guerra Santa será proclamada entre os dias 24 e 28 do corrente, durante as comemorações árabes da festa do sacrifício no Iraque. Essa resolução talvez seja tomada durante a reunião de chefes árabes na Síria”. Acrescenta o telegrama que “as capitais dos Estados árabes estão em constante comunicação discutindo-se as últimas medidas e fixando-se a ordem do dia para a próxima reunião dos chefes. Anuncia-se também que os líderes árabes discutem a questão do comando do exército árabe, que talvez seja confiado ao general reformado Tahan Hachimi, do Iraque, que é pessoa de confiança daqueles chefes”. É possível que estes rumores não se realizem inteiramente. Em todo o caso, o simples fato de que eles tenham tomado tal corpo que as agências telegráficas o tenham difundido pelo mundo inteiro, prova bem em que direção se orientam os espíritos, e qual lhes parece a natureza profunda do problema, e o rumo que normalmente ele deverá tomar.
Discursando em Argel na semana passada, o general De Gaulle aludiu de certa forma a todos estes fatos, quando mostrou que a África Setentrional Francesa está imergindo no caos, na agitação, na anarquia, e censurou por isto a debilidade manifesta do atual gabinete. O problema entrou, pois, de cheio, na esfera da grande política.
Mas os católicos continuam a dormir. No Horto das Oliveiras, eles dormiram também…

quarta-feira, 27 de julho de 2016

“Selfies”, narcisismo e amor verdadeiro de si mesmo

“Selfies”, narcisismo e amor verdadeiro de si mesmo

Em qualquer situação, certas pessoas se fotografam para depois postar nas redes sociais para que os outros vejam que elas estiveram em tal evento ou em tal restaurante, por exemplo. Deixam até mesmo de aproveitar daquele momento, às vezes único, para ter o “prazer” de se fotografar. O importante é que os outros vejam o que elas estão fazendo e como elas se sentem felizes com isto. Neste sentido, as “selfies” mais facilmente podem deslizar para um exagero do ego do que as simples fotografias.
Com a advento do “smartphone” e a facilidade para fazer fotografias, apareceu o costume das pessoas se auto-fotografarem – em linguagem moderna, “selfie” – e colocar nas redes sociais a própria imagem. Tal costume, se não se toma cuidado, pode chegar a assemelhar-se ao narcisismo.
Obama fazendo "selfie"
Narciso, personagem da literatura grega, era um jovem que admirava a própria imagem refletida nas águas de um rio e acabou por apaixonar por sua própria pessoa. Essa paixão chegou a tal ponto que o levou ao suicídio, atirando-se no rio onde via a sua imagem refletida. Por isso, em nossos dias costuma-se classificar como narcisista a pessoa que se fixa exageradamente na própria imagem refletida no espelho, admirando o próprio físico ou a própria beleza.
O narcisismo tem sido um problema de ordem psiquiátrica e tem levado os psiquiatras a diversos estudos sobre a sua causa.
O narcisista ainda que aparente possuir uma vida perfeita, vive com uma grande solidão e amargura dentro dele. A vida fictícia que criou para os outros julgarem que ele é o melhor, faz com que a pessoa egocêntrica tenha uma grande necessidade de se refugiar e fechar em si mesma pois ‘sabe’, no seu inconsciente, que tudo aquilo não é tão verdadeiro assim. O final desta postura de vida, caso se continue com esta atitude, é o caminho escuro e sombrio da solidão.”  [1]
Do ponto de vista moral, narcisismo é propriamente um problema de alma, pois, como ensina Santo Agostinho,  “muita gente se perde porque se ama mal“.  O verdadeiro amor a nós mesmos consiste na preservação de nossa vida moral, porque fomos criados à imagem e semelhança de Deus. O amor de si mesmo só é legítimo quando tem por fim o amor de Deus. Devemos preservar de todo mal essa imagem criada de Deus que somos nós. As “selfies”, no limite, podem chegar a ser uma forma de narcisismo e de amor próprio delirante.
Em qualquer situação, certas pessoas se fotografam para depois postar nas redes sociais para que os outros vejam que elas estiveram em tal evento ou em tal restaurante, por exemplo. Deixam até mesmo de aproveitar daquele momento, às vezes único, para ter o “prazer” de se fotografar. O importante é que os outros vejam o que elas estão fazendo e como elas se sentem felizes com isto. Neste sentido, as “selfies” mais facilmente podem deslizar para um exagero do ego do que as simples fotografias.
Nas redes sociais aparecem “selfies” de pessoas nas situações mais inimagináveis ou mesmo fazendo-se fotografar com o Papa. Nesse caso, o importante não é o Papa, mas que os outros vejam que elas estiveram com um personagem importante e que, por isso, elas são importantes também. Elas querem apenas se afirmar diante das pessoas que verão nas redes sociais aquela fotografia.
Santo Tomás de Aquino diz que: “Nem todos os homens pensam ser o que eles são, pois o principal no homem é a alma racional e o que é secundário é a natureza sensível e corporal: a primeira é chamada pelo Apóstolo de ‘homem interior’, e a segunda de ‘homem exterior’ (cf. 2 Cor 4, 16). Os bons apreciam em si mesmos, como principal, a natureza racional, ou o homem interior, e por isso consideram-se como sendo o que são. Mas os maus creem que o principal neles é a natureza sensível e corporal, ou o homem exterior. Por essa razão, não se conhecendo bem a si mesmos, eles não se amam verdadeiramente, mas amam somente o que julgam ser. Ao contrário, os bons, conhecendo-se verdadeiramente a si mesmos, amam-se de verdade.” [2]
Referências:
2 – Suma Teológica, II-II, q. 25, a. 7

sábado, 23 de julho de 2016

Reflexões atualizadas sobre “direita” e “esquerda”


Reflexões atualizadas sobre “direita” e “esquerda”


Parlamento Francês em 1789, pintura de Auguste Couder
Do ponto de vista ideológico e político, os termos “direita” e “esquerda” apareceram durante a Revolução Francesa de 1789, quando os membros da Assembleia Nacional se dividiam em partidários da religião, do rei e da ordem, sentados à direita do presidente, e os partidários da revolução igualitária e do ateísmo à sua esquerda.
Um deputado, o Barão de Gauville, explicou: “Nós começamos a nos reconhecer uns aos outros: aqueles que eram leais à religião e ao rei ficaram sentados à direita, de modo a evitar os gritos, as imprecações e indecências que tinham rédea livre no lado oposto.”
Ao longo das décadas os termos “direita” e “esquerda” foram se adaptando para designar as metamorfoses sofridas pelas novas orientações religiosas, ideológicas, sociais e políticas que vieram se explicitando. Mas sempre conservando na raiz sua ligação com a origem dos termos.
Século XIX: Monarquia x República
Durante o século XIX, a “direita” designava sobretudo os monarquistas, que tinham por evidente a ligação entre monarquia e catolicismo, e que alcançaram enorme influência e apoio popular, chegando quase a galgar o poder. O grande golpe contra essa corrente foi dado pelo Papa Leão XIII, que instituiu a política do chamado “Ralliement” (reconciliação), pela qual os católicos ficavam livres para apoiar a República maçônica e igualitária da época, expressão política e ideológica da “esquerda”.
Século XX: TFP e “esquerda católica”
No século XX, os herdeiros mais autênticos da Revolução foram os comunistas, que passaram a ser designados como “extrema-esquerda”, enquanto seus homólogos socialistas, distribuídos em diferentes gamas de densidade ideológica, representavam diversos graus de “esquerdismo”, desde os socialdemocratas até os anarquistas.
A “direita” anticomunista exprimiu toda a sua autenticidade no movimento Tradição, Família e Propriedade (TFP), fundado por Plinio Corrêa de Oliveira. Diluições do “direitismo” foram representadas pelas várias formas da corrente conservadora, como também da pró-capitalista, sendo presentes ainda no panorama os remanescentes da posição monarquista.
Um fenômeno novo nos arraiais da “esquerda”, ao menos enquanto força de influência, foi a chamada “esquerda católica”, que trabalhou em favor da Revolução com muito mais garra, inteligência e poder do que os comunistas e socialistas de todos os matizes. Através de suas várias facetas – como as Comunidades Eclesiais de Base e a Teologia da Libertação – e gozando de altos apoios na esfera eclesiástica, a “esquerda católica” não só dispensou proteção aos guerrilheiros e terroristas, mas tinha potencial para derrocar as instituições em vários países da América Latina, com vistas depois a influenciar a Europa e a Ásia. Não fossem as contínuas denúncias e a oposição inteligente que lhe fez a TFP, a história das Américas hoje seria outra.
Assim, embora a “esquerda” tivesse provocado grandes e fundas devastações na religião, na sociedade e na política durante o século XX, entretanto não conseguiu alcançar seu objetivo maior, que era a imposição, como fato consumado, de sua ideologia antinatural e anticristã aos povos e às nações. As resistências foram grandes e o principal fator de penetração com que ela contava – a “esquerda católica” – chegou ao fim do milênio muito avariada em seu prestígio e sua influência.
Albores do século XXI: o ecologismo
Com isso adentramos o século XXI. Por necessidade de sobrevivência, mas também para dar um passo adiante nas sendas da Revolução, a “esquerda” se metamorfoseou em ecologismo. Tal metamorfose trouxe uma dupla vantagem para as hostes revolucionárias. Primeiramente, ela se apresentava aos olhos dos povos como nada tendo a ver com o comunismo e o socialismo, já muito desgastados. A Revolução, na sua fase ecologista, deixou cair sua pele vermelha e revestiu-se de uma verde. De outro lado – esta é a segunda vantagem – manteve desapercebidamente em seu bojo todas as teses da esquerda mais radical, como sejam, resumindo, de um lado o igualitarismo social e religioso, e de outro o miserabilismo anticapitalista. A própria “esquerda católica” revestiu-se de verde, passando a usar uma roupagem de catolicismo ecológico.
Hoje, os seguidores fiéis de Plinio Corrêa de Oliveira se espraiam por numerosos países do mundo, em diversas associações coirmãs, com uma atuação e uma repercussão impressionantes. No Brasil, eles estão representados no Instituto Plinio Corrêa de Oliveira.
Importa ainda notar que a “esquerda”, mesmo tendo perdido muito de seu elã e de sua influência junto ao público, entretanto conseguiu galgar elevados postos, tanto no plano religioso quanto no temporal, o que significa um trunfo não pequeno.
Ainda estamos nos albores do século XXI. Como prosseguirá essa batalha? Não sabemos. Mas o certo é que o almejado cumprimento das profecias de Fátima pode mudar todas as regras do jogo.
Outro capítulo ainda haveria para tratar, importantíssimo e mesmo fundamental: o papel do “centro” nessa batalha. Mas isso nos levaria longe demais.
Cristo sentado à direita do Pai
Uma observação final se impõe. Pode-se afirmar que a guerra “direita” x “esquerda” interessa ao Céu? Sobre esse ponto, de capital importância, haveria muito a dizer. Como, porém, o espaço que me é destinado vai chegando ao fim, limito-me a reproduzir um testemunho do conhecido e conceituado teólogo dominicano francês Reginald Garrigou-Lagrange (1877-1964). Ei-lo:
“Pessoalmente, sou um homem de direita, e não vejo por que o haveria de esconder. Creio que muitos daqueles que se servem da fórmula citada, fazem uso dela porque abandonam a direita para se inclinar à esquerda, e querendo evitar um excesso, caem no excesso contrário, como aconteceu em França nos últimos anos. Creio, também, que é preciso não confundir a verdadeira direita com as falsas direitas, que defendem uma ordem falsa e não a verdadeira. Mas a direita verdadeira, que defende a ordem fundada sobre a justiça, parece ser um reflexo do que a Escritura chama a direita de Deus, quando diz que Cristo está sentado à direita do seu Pai e que os eleitos estarão à direita do Altíssimo.”(http://www.pliniocorreadeoliveira.info/Cruzado0305.htm)

segunda-feira, 18 de julho de 2016

A diferença entre viver sozinho e a vida contemplativa


A diferença entre viver sozinho e a vida contemplativa


Aristóteles dividia os homens em três categorias, de acordo com a vida que levavam: a vida de prazer, a vida de políticos e a vida contemplativa.[1] Excetuando a vida de políticos, que segundo ele era a classe de homens honrados e virtuosos – muito diferente de nossos dias! – podemos dizer que essa classificação pode ser aplicada hoje. “Os homens de tipo mais vulgar – diz o filósofo – parecem identificar o bem ou a felicidade com o prazer, e por isso amam a vida dos gozos.” [2]
Como sabemos, os contemplativos são aqueles que levam a vida sozinhos, fazem orações, louvam a Deus, estudam e fazem sacrifícios etc., como são (ou deveriam ser) os de algumas ordens religiosas. Contudo, muito diferente desses religiosos, surgiu nos últimos anos a categoria dos que preferem viver sozinhos.
Mais de 8,2 milhões de pessoas no Brasil moram sozinhos em casas ou apartamentos. Segundo uma senhora de 82 anos de idade, ela mora sozinha porque “faz tudo o que tem vontade”. Outra solitária diz: “Estou em paz comigo mesma, então eu não preciso de ninguém. Eu converso com os meus gatinhos.”[3]
Quase 40% das pessoas que moram sozinhas têm mais de 60 anos de idade. Tais pessoas, em sua grande maioria, já foram casadas, ficaram viúvas, ou se divorciaram e mandaram seus filhos para fora de casa.
Segundo a FIPE – Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas – 46% das pessoas que compraram imóveis na capital paulista, nos últimos anos, pretendiam morar sozinhas. Esta tendência contraria a história da humanidade, como observa o filósofo Pondé: “A história da espécie (humana) é muito voltada para a necessidade de viver juntos compartilhando o combate aos riscos.” Poderíamos acrescentar que contraria também o natural instinto de sociabilidade da natureza humana.
Já o jurista Luiz Flávio Gomes comenta: “Isto de morar sozinho vai na linha da cultura vigente desde os anos 80 e que é uma cultura individualista e não mais o coletivo. Ademais, os relacionamentos hoje são líquidos, é passageiro e fugaz, num instante se vai.”
São Gregório Magno, citado por Santo Tomás de Aquino, diz que “a vida contemplativa preserva o amor de Deus e o amor do próximo com toda a nossa força, e repousa da atividade exterior de tal modo que agora, não mais lhe agradando a atividade exterior, e tendo desprezado os cuidados terrenos, a alma é consumida pelo desejo de ver a face de seu Criador“. [4]
Há uma diferença fundamental entre as pessoas que vivem sozinhas e a vida contemplativa descrita pelo grande Santo, pois boa parte delas quer ficar sozinha por puro egoísmo, sem nenhuma referência a Deus. Aliás, estas pessoas levam uma vida como se Ele não existisse. Outras vivem sozinhas porque durante muitos anos praticaram o controle da natalidade e com isso não têm filhos que as possam ajudar. Ou então porque os educaram mal e os filhos se tornaram pessoas desalmadas que não se preocupam com os pais.
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Referências:
[3] https://www.youtube.com/watch?v=iLFowGRVW1A
[4] http://www.cristianismo.org.br/st-3sn25.htm

sábado, 16 de julho de 2016

Pronunciamento do IPCO demonstra as graves consequências do documento pós sinodal Amoris laetitia

A Amoris laetitia abre os braços da Igreja e da sociedade para a demolição programada do casamento e da família

PRONUNCIAMENTO DO 
INSTITUTO PLINIO CORRÊA DE OLIVEIRA 

AMORIS LAETITIA ABRE OS BRAÇOS DA IGREJA E DA SOCIEDADE PARA A DEMOLIÇÃO PROGRAMADA DO CASAMENTO E DA FAMÍLIA 


APELO AOS PRELADOS E AOS MOVIMENTOS LEIGOS SILENCIOSOS 


Papa Francisco assinando
a Amoris Laetitia
Face às sérias reservas e objeções apresentadas por personalidades da Igreja e do laicato católico à Exortação ApostólicaAmoris Laetitia (AL) [foto ao lado], e dada a crescente confusão que esse documento vem semeando nos espíritos em temas de moral familiar, o Instituto Plinio Corrêa de Oliveira julgou seu dever se pronunciar publicamente a respeito. No dia 16 de julho, dia de Nossa Senhora do Carmo, emitiu uma declaração pública sob o título acima. 

Integrado por leigos católicos, o Instituto tem-se empenhado desde sua fundação na defesa da instituição da família, alvo central da ofensiva revolucionária no século XXI.

O documento lembra os quase 900 mil fiéis do mundo todo, incluindo Cardeais, Arcebispos e Bispos, que enviaram ao Papa Francisco uma “Filial Súplica”, na qual Lhe pediam respeitosamente que não permitisse “a relativização do próprio ensinamento de Jesus Cristo” no tocante à família. Após a publicação de Amoris laetitia esse escol da população católica mundial só teve a experimentar o gosto amargo da decepção. O Papa Francisco, tão pródigo em receber e afagar acatólicos e até anticatólicos do mundo todo, não teve uma palavra para esses fiéis. 

GRAVE RUPTURA COM O ENSINAMENTO DE IGREJA – RELATIVIZAÇÃO DO DECÁLOGO 

Caberia esperar que um documento pontifício dedicado à família advertisse sobre essa gravíssima ameaça. Mas pelo contrário, na AL se encontra uma indissimulada mudança fundamental na prática pastoral relativa aos chamados “casais irregulares”, e em particular os divorciados ditos “recasados”, permitindo que sejam absolvidos na confissão e recebam a Sagrada Comunhão, com a única ressalva de que seja “caso a caso”, conforme o “discernimento” do sacerdote. 

Autorizadas figuras da Igreja e do laicato têm denunciado que tal mudança não é apenas disciplinar, mas implica grave ruptura com o ensinamento tradicional da Igreja. E pedem, portanto, a revogação da AL, pedido ao qual o Instituto Plinio Corrêa de Oliveira se solidariza fundamentadamente. Isso se dá enquanto eclesiásticos progressistas aplaudem a ALcalorosamente. O cardeal Cristoph Schönborn, ao apresentar oficialmente o texto, regozijou-se porque este “supera” a divisão — que ele julga “artificial”— entre uniões ditas regulares e irregulares, ou seja lícitas e pecaminosas. 

De fato, para a AL, conforme às circunstâncias, o concubinato e o adultério (a AL evita as palavras, mas o sentido é claro) poderiam até constituir uma “doação” a Deus!; e que inclusive haveria nessas situações de pecado “sinais de amor” que “refletem de algum modo o amor de Deus”. Com essa linguagem insidiosa, não apenas perdem sua validade prática o 6° e o 9° Mandamentos (“Não cometerás adultério” e “Não desejarás a mulher do teu próximo”), mas é toda a ordem natural e divina sintetizada no Decálogo que fica relativizada, em nome de uma apreciação subjetiva das circunstâncias.

UM NOVO MODELO FAMILIAR ANTI-HIERÁRQUICO

Gravemente questionável é também o modelo “comunitário” de família proposto pela AL, que abunda em alusões negativistas e depreciativas à família tradicional baseada na autoridade paterna, enquanto apresenta a figura idílica de um modelo familiar igualitário, que despoja o marido de sua função de chefe de família e dilui o princípio de autoridade.

Ademais, desvaloriza o preceito de São Paulo, “as mulheres sejam submissas a seus maridos” (Ef. 5: 22), aduzindo ser uma mera “roupagem cultural” da época. E nisto se contrapõe à doutrina católica magistralmente exposta na Encíclica Casti Connubi de Pio XI [quadro acima], que ensina ser imutável a ordem hierárquica na família. 
A instituição da família é um dos fundamentos da civilização cristã.
“Em nenhum tempo e lugar é lícito subverter ou prejudicar a estrutura essencial da própria família e a sua lei firmemente estabelecida por Deus” (Papa Pio XI)

EVOLUCIONISMO ANTROPOLÓGICO – INVERSÃO DA ORDEM NAS FINALIDADES DO CASAMENTO 

Tanto a relativização do adultério como o novo paradigma familiar preconizado pela AL se justificariam por uma suposta “mudança antropológica” que estaria a requerer “soluções mais inculturadas”, conforme o grau evolutivo dessa mudança em cada lugar. O cardeal Kasper, principal inspirador da AL, traz exemplos dessa “inculturação”, nos quais o sentimentalismo e o subjetivismo erigem-se em critério para admitir divorciados “recasados” aos Sacramentos. 

Afastando-se do modelo tradicional e institucional do matrimônio e aproximando-se do modelo individualista contemporâneo, no qual o vínculo matrimonial fica reduzido a um mero reconhecimento social e legal do afeto mútuo do casal, a AL consagra uma radical inversão na hierarquia dos fins do matrimônio, ao sustentar que este seria “em primeiro lugar”, uma “comunidade da vida e do amor conjugal”. Esta afirmação contradiz frontalmente o ensinamento magisterial da Igreja compendiado na Casti Connubi, de que o casamento “tem por fim primeiro e íntimo, não o aperfeiçoamento pessoal dos esposos, mas sim a procriação e a educação da nova vida. Os outros fins, embora sendo igualmente queridos pela natureza, [...] lhe são essencialmente subordinados”.

Nesse sentido o Instituto Plinio Corrêa de Oliveira faz notar que, ao se rebaixar a um segundo lugar a finalidade procriativa do casamento e dar a primazia ao “compromisso público de amor”, até os indivíduos LGBT poderão alegar que eles também se “amam”, e reclamar assim um status matrimonial!

LEGÍTIMA E RESPEITOSA RESISTÊNCIA – APELO AOS PRELADOS SILENCIOSOS 

São Pedro ensina que é preciso 
“obedecer a Deus antes que aos homens” (At. 5, 29)
Em conclusão de sua pormenorizada e documentada análise, o Instituto Plinio Corrêa de Oliveira assinala que, ante um texto tão próprio a desorientar os fiéis e a diluir neles a adesão aos ensinamentos morais da Igreja,“por um dever de consciência e com todo o respeito que merecem a investidura e a pessoa do Sumo Pontífice, vemo-nos obrigados a externar publicamente os graves reparos que o documento suscita em nós”, e “dizer lealmente ao Papa Francisco que não podemos em consciência aceitar os enunciados, a disciplina sacramental e as propostas pastorais da Amoris laetitia que vimos questionando aqui”.

Ao dar este passo de “legítima e respeitosa resistência” aos pontos da ALconflitantes com a doutrina da Igreja, os membros do Instituto em seu documento afirmam que se sentem amparados no ensinamento de São Pedro, de que é preciso“obedecer a Deus antes que aos homens” (At. 5, 29); bem como no exemplo de São Paulo, que “resistiu em face” ao mesmo São Pedro (Gal. 2, 11), precisamente a propósito de erros disciplinares que este propunha; e também pelo Direito Canônico, que no cânon 212 § 3 consagra o direito, e por vezes o até dever, de expor respeitosamente a discordância da Autoridade eclesiástica. E acrescenta o documento: “Pela similitude de situações, adotamos aqui a afirmação do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira na conclusão de seu famoso manifesto de Resistência à política de distensão do Vaticano com os governos comunistas: ‘Esta explicação se impunha. Ela tem o caráter de uma legítima defesa de nossas consciências de católicos’”

Instituto Plinio Corrêa de Oliveira conclui instando aos Prelados e movimentos até aqui silenciosos a “dissipar a confusão doutrinária reinante”, e reafirmar“publicamente e por todos os meios ao seu alcance, os ensinamentos de Nosso Senhor Jesus Cristo e da Santa Igreja”, sobre a natureza divina e irreformável do matrimônio, seu caráter indissolúvel, à primazia da procriação sobre as demais finalidades do casamento, à estrutura hierárquica da família, e “a impossibilidade de se dar a absolvição sacramental e a Sagrada Comunhão aos que se obstinam em viver publicamente numa situação objetiva de pecado”

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Recomendamos a leitura do texto completo do estudo em:
www.ipco.org.br

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Por que a beleza importa?

Por que a beleza importa?



Em uma sociedade consumista, pensa-se em primeiro lugar na utilidade das coisas, enquanto a beleza é colocada em segundo plano. Para tal sociedade, a arte é inútil, por isso não tem valor. Sendo a arte inútil, não importa o que vc lê, olha ou ouve. Esta é a razão porque a beleza está desaparecendo do nosso mundo.

Com o título em epígrafe, a BBC de Londres veiculou um documentário em 28/11/2009, dirigido pelo filósofo inglês, Roger Scruton, no qual demonstrou que a partir do início do século XX a humanidade vem perdendo o senso ético e estético da Beleza e passou a prestar um culto à feiura e a consequência disso é um deserto espiritual. Segundo o professor, “nosso mundo virou as costas para a beleza”, de modo que nos encontramos “rodeados de feiura e demência”.
Scruton inicia o seu documentário com um pequeno histórico e descreve as consequências da decadência da arte em nossos dias:
Tereza d”Áustria. Rainha da Hungria e
 da Boêmia (1740-1780). Autor desconhecido.
“Em qualquer época entre 1750 e 1930, se você pedisse às pessoas cultas para descrever o objetivo da poesia, da arte ou da música, elas teriam respondido: a Beleza. E se você perguntasse pela razão disso, você aprenderia que a Beleza é um valor, tão importante quanto a Verdade e o Bem.
“Depois, no século XX, a beleza deixou de ser importante. A arte, cada vez mais, concentrou-se em perturbar e em quebrar tabus morais. Não era a beleza, mas a originalidade, conseguida por qualquer meio e a qualquer custo moral, que ganhava os prêmios. 
“Não apenas a arte fez um culto à feiura; a arquitetura também se tornou desalmada e estéril. E não foi somente o nosso ambiente físico que se tornou feio. Nossa linguagem, nossa música e nossas maneiras estão cada vez mais rudes, egoístas e ofensivas; como se a beleza e o bom gosto não tivessem nenhum lugar real em nossas vidas.  […] 
Retrato de Maria Tereza D’Áustria, Picasso . Este “artista” confessa: “Quando estou sozinho comigo mesmo, não tenho a coragem de me considerar um artista no sentido antigo e grande da palavra. Giotto, Ticiano, Rembrandt e Goya foram grandes pintores: eu sou apenas um divertidor do público – um charlatão.”
“Eu acho que nós estamos perdendo a beleza e há um risco de que, com isso, nós percamos o sentido da vida.”
A Beleza, segundo Scruton, tem sido o centro de nossa civilização durante mais de dois mil anos. Contudo, especialmente a partir do início do século XX, uma verdadeira revolução vem acontecendo e mudou completamente o sentido da arte.
Se uma obra de arte não é nada mais que uma ideia – observa Scruton -, qualquer um pode ser um artista e qualquer objeto pode ser uma obra de arte. Não há mais necessidade de habilidade, gosto ou criatividade.
Então, a arte de hoje nos mostra o mundo como ele é, o aqui e agora com todas suas imperfeições; mas o resultado realmente é arte? Certamente uma coisa não é uma obra de arte somente porque mostra um pedaço da realidade (a feiura incluída) e se auto intitula de ‘arte’. A arte precisa de criatividade, (…) ela é um chamado para que os outros vejam o mundo como o artista o vê.”
Porque os homens viraram as costas à beleza, vivemos num mundo cercado de feiuras
Scruton enfatiza que a beleza importa, não de uma maneira subjetiva, mas como uma necessidade universal dos seres humanos. Ele observa ainda que se ignorarmos isso, nós nos encontraremos num deserto espiritual.
Às vezes a intenção é chocar e isto é feito como se fosse uma elaborada brincadeira de mau gosto, mas os críticos continuam a encorajar tal “arte”. Ninguém tem coragem de dizer “o rei está nu”.
Numa entrevista à BBC, em 05/06/1966, Marchel Duchamp deixou claro o propósito de destruir a verdadeira Arte:
“BBC – O que vc está tentando fazer é desvalorizar a arte. Se eu digo que isto é uma obra de arte, isto se torna uma “obra de arte”…
Duchamp – Sim, mas a expressão “obra de arte” não é importante para mim. Eu não me importo com a palavra “arte” porque isto se tornou tão desacreditada, digamos.
BBC – Mas vc de fato contribuiu para o seu descrédito intencionalmente.
Duchamp – Sim, foi intencional, como uma forma de me livrar dela, assim como muitas pessoas se livraram da religião.  (destaque nosso)
Michel Craig-Martin, da Universidade de Yale, ao comentar o urinol de Duchamp, numa entrevista concedida a Scruton, declara:  “Essa é parte da função da arte: tornar belo, fazer alguém ver algo como belo, algo que ninguém havia visto como belo até o momento.”
E Scruton retruca, ironicamente: “Bem, como uma ‘lata de fezes’?”
A pergunta o deixa incomodado, e fica sem saber o que responder:
“- Bem, err,  não estou .. err.. se é algo bonito, mas está tomando um exemplo que não está tentando ser belo…”
Em uma sociedade consumista, pensa-se em primeiro lugar na utilidade das coisas, enquanto a beleza é colocada em segundo plano. Para tal sociedade, a arte é inútil, por isso não tem valor.
Sendo a arte inútil, não importa o que vc lê, olha ou ouve. Esta é a razão porque a beleza está desaparecendo do nosso mundo.
Uma gota de vida no meio do deserto
No século XX os arquitetos colocaram de lado a beleza e se preocuparam apenas com a utilidade. Eles não se importavam com o que os edifícios pareciam, mas apenas para o que serviam.
Retrato de Maria Cidade fantasma Sanzhi, Taiwan
O autor conta que quando era pequeno, demoliram uma rua inteira de seu bairro para construir prédios com arquiteturas modernistas que teriam mais “utilidades”, sem nenhuma preocupação com a beleza. Lá construíram uma estação de ônibus e diversos escritórios. Com o tempo, o local foi totalmente abandonado, permanecendo apenas pombos e paredes pichadas. Mas ele não culpa os pichadores, porque os prédios tinham sido construídos por vândalos. Os pichadores apenas terminaram o trabalho. Por todos os lados que se olhava só se via feiura.
No meio daquele lugar horrível sobrou uma pequena construção com arquitetura antiga onde outrora fora uma forjaria e que tinham feito ali um Café bastante frequentado. Aquilo era como uma gota de vida no meio do deserto. E a vida vinha daquele edifício que tinha ficado com aquela arquitetura antiga.
Qual a utilidade da beleza?
Isto fez Scruton pensar no que diz Oscar Wilde, talvez de uma forma irônica, segundo o qual toda arte é absolutamente inútil: “Priorize a utilidade – observa – e você a perderá; priorize a beleza e o que construir será útil para sempre. Ocorre que nada é mais útil do que o inútil. Vemos isso na arquitetura tradicional, com seus adornos sem nenhuma utilidade prática, seus detalhes decorativos. São ornamentos sem a tirania do útil que satisfazem a nossa necessidade de harmonia. Estas coisas que nos fazem sentir em casa. Afinal, não somos governados apenas por necessidades básicas como comer, beber e dormir. Temos necessidades morais e espirituais.” (destaque nosso)
As obras dos homens completam a obra da Criação
"Pietá", Michelângelo
São Boaventura nos ensina que há uma semelhança entre a criatura e o Criador. É essa semelhança que nos permite elevar-nos até Deus por meio das criaturas, e é nesse grande anseio de elevação que se deve encontrar o lugar da arte.
O Prof. Plinio Corrêa de Oliveira escreve em seu célebre ensaio, “Revolução e Contra- Revolução”, que “Deus estabeleceu misteriosas e admiráveis relações entre certas formas, cores, sons, perfumes, sabores, e certos estados de alma”.(1)
Pio XII ensinou: “O homem e todas as suas ações devem manifestar, em louvor e glória do Criador, a infinita perfeição de Deus, e imitá-la tanto quanto possível. Por isto o homem, destinado por sua natureza a alcançar esse fim supremo, deve, no seu agir, conformar-se ao divino arquétipo, e nesta direção orientar todas as faculdades da alma e do corpo, ordenando-as retamente entre si, e devidamente domando-as para o conseguimento do fim.”(2)
Diz o poeta Dante Alighieri (3) que as obras de arte são netas de Deus, pois o homem é filho de Deus e as obras de arte são filhas dos homens. Há nelas, portanto, vestígios do Criador, que importa discernir.
Referências:
1 – Plinio Corrêa de Oliveira, “Revolução e Contra-Revolução”, cap. 10 – 2.
2 – Encíclica Musicae Sacrae Disciplina, de 25-12-55.
3 – ALIGHIERI, Dante. Divina Comédia. Inferno, Canto XI, v.105.